segunda-feira, 7 de março de 2011

Dia Internacional da Mulher...

Caricatura sobre foto da máquina de escrever que foi de Cecília Meireles, no casarão em que ela viveu, no Rio de Janeiro


Cecília, a jornalista.

Cladismari Zambon 

Cecília Meireles passou a maior parte de sua vida diante de uma máquina de escrever. Embora seja mais conhecida por sua obra em verso, a pastora das nuvens que fala da transitoriedade da vida, do efêmero e do subjetivo em suas poesias mostra outra face em sua numerosa obra em prosa. De 1920 a 1964, quando sua última crônica foi publicada na Folha de S.Paulo, a escritora escreveu cerca de 2.500 crônicas. Sua estréia na redação de um jornal se deu em 1930, década marcada pela transição de duas grandes guerras e, no Brasil, pela revolução de outubro.

Na imprensa pipocavam jornais de adesão ao novo regime. Assim surgiu o "Diário de Notícias", em junho de 1930. Mais do que um simples matutino, o jornal trazia uma seção diária dedicada à educação e à política, a "Página de Educação", cuja diretora era Cecília Meireles. Jornalista liberal, crítica, engajada, partidária incansável das liberdades individuais, lutava pela instauração de uma república democrática, bem diferente daquela regida pelo populismo autoritário do regime que se descortinava após a revolução. Acreditava na liberdade e na criatividade contra a opressão e a massificação da educação.

Os acontecimentos da época eram tratados por Cecília em suas crônicas pois, como nos aponta Massaud Moisés, o cronista sente realmente o que exprime. As crônicas em geral são breves e seu estilo direto, espontâneo e jornalístico, reagindo de imediato ao acontecimento. As idéias e críticas de Cecília, no entanto, foram recebidas com resistência e perseguições por motivos ideológicos, políticos e estéticos.

Era partidária dos princípios da Escola Nova, a escola moderna do filósofo norte-americano John Dewey e assistiu à ascensão de um estado autoritário e de uma Igreja Católica que tentava recuperar seu poder após quarenta anos de uma república laica, com ares positivistas. Se a história da literatura desconhece a Cecília Meireles da luta política, desconhece também a que sofreu perseguições da censura de Vargas, dos católicos e em concursos literários.

A "Página de Educação" se encerrou para Cecília em janeiro de 1933, quando se cansou das manobras políticas do governo e o estado da educação no Rio de Janeiro. Chega mesmo a manifestar em sua correspondência o "horror" que lhe causava o jornalismo em sua vida. Ficou para trás a jornalista engajada que, entre 1930 e 1933, assinou sua página diária sobre educação - na qual chegou a acusar o então ministro de educação, Francisco Campos, de medalhão e o então presidente, Getúlio Vargas, de Sr.Ditador.

Foram mais de mil artigos escritos em que Cecília lutava contra a inclusão do ensino religioso e defendia as liberdades, como por exemplo, a criação de escolas mistas em que ambos os sexos pudessem dividir o mesmo espaço. É bom lembrar que isso ocorreu entre 1930 e 1933, quando a mulher sequer exercia o direito de voto, uma vez que as urnas passaram a contar com o voto feminino apenas em 1934.

Entretanto, logo após sua despedida da "Página de Educação", Cecília Meireles volta aos jornais. Desta vez para o carioca "A Nação", no qual foi contratada com um senão: poderia escrever sobre tudo, menos sobre política! Durante toda a sua vida a poeta se dedicou ao jornalismo. Na década de 40 escreveu para "A Manhã" uma coluna semanal sobre folclore. Em seguida, na década de 50, de volta ao "Diário de Notícias", ocupava o famoso rodapé de literatura do "Suplemento Literário", pelo qual já tinham passado Mário de Andrade e Sérgio Buarque de Holanda. Terminou sua carreira na imprensa na década de 60, na Folha de São Paulo.



Cladismari Zambon é Psicóloga Clínica e atende crianças, adolescentes e adultos em Porto Alegre (RS).

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Dentre as quase duas mil e quinhentas crônicas que escreveu ao longo de sua vida, escolhemos duas que foram publicadas já em período de maturidade intelectual.



AS CRÔNICAS DE CECÍLIA VOCÊ ENCONTRA AQUI.

5 comentários:

LOUCA PELA VIDA disse...

Sempre interessante Cecília...

Paula disse...

Uma mulher feita de palavras e sentidos... Um exemplo.
Parabéns pelo blog, NETTO!
Abs.

Bernadete Ferraz - Teresina (PI) disse...

BÊNÇÃOS
À Cecília Meireles

Você
Teve tempo para ser poetisa
Teve teto para abrigar a sensibilidade
Teve tato para esculpir estrofes
Teve tino para fotografar em versos
Teve trato para gerar figuras
Teve tipo para agasalhar a Língua
Teve topo para expor seus poemas
Teve tudo para fechar o círculo em poesia
Até ser sinônimo.

Do livro Parto Natural (Nov. 2007)
de Bernadete Maria de Andrade Ferraz

B.M.A.F. - THE (PI) disse...

Cara Lente de Deus
A homenagem do Picinez à mulher jornalista, muito especialmente (vamos redundar) à imensurável Cecília Meireles, minha musa-holofote das letras corretas, sensíveis e poéticas é mui digna de registros. Lembrei-me de um texto dela:
Primeira fábula da Ursa Maior: a mulher, o pavão e a pomba", Obra em Prosa - Volume 1 e também do livro A Farpa na Lira - Cecília Meireles na Revolução de 30, de Valéria Lamego, jornalista, pesquisadora e doutorada em Literatura comparada pela UFRJ, que esmiúça o início da década de 30 quando "Cecília Meireles era uma jornalista engajada na cobertura da revolução que derrubou o presidente Washington Luiz e levou Getúlio Vargas ao poder. " A escolha da homenageada foi providencial.

Gracinha Torres disse...

Amigo, você é formidável.
Muito obrigada por esta homenagem.
Nada tão significativo que Cecília.
Abração.

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