Por que escrevo? |
Julio Cortázar |
"Eu gostava de algumas palavras, não gostava de outras, algumas tinham certo desenho, uma certa cor. Uma de minhas lembranças de quando estava doente (fui um menino muito doente, passava longas temporadas de cama com asma e pleurisia, coisas desse tipo) é a de me ver escrevendo palavras com o dedo, contra uma parede. Eu esticava o dedo e escrevia palavras, e via as palavras se formando no ar. Palavras que eram, muitas vezes, fetiches, palavras mágicas. Isso é algo que depois me perseguiu ao longo da vida. Havia certos nomes próprios – e sei lá por quê – que para mim tinham uma carga mágica. Naquela época havia uma atriz espanhola que se chamava Lola Membrives, muito famosa na Argentina. Bom, eu me vejo doente – aos sete anos provavelmente – escrevendo com o dedo no ar Lo-la-Mem-bri-ves, Lo-la-Mem-bri-ves. A palavra ficava desenhada no ar e eu me sentia profundamente identificado com ela. De Lola Membrives, a pessoa, eu não sabia muita coisa, nunca a tinha visto. Na realidade, eram meus pais que iam ver as peças onde ela trabalhava. E foi nesse mesmo momento que comecei a brincar com as palavras, a desvinculá-las cada vez mais de sua utilidade pragmática e comecei a descobrir os palíndromos, que depois apareceram nos meus livros... Desde muito pequeno, minha relação com as palavras, com a escrita, não se diferencia da minha relação com o mundo em geral. Eu não acho que nasci para aceitar as coisas tal como estão, tal como me são oferecidas". |
Nasceu em 1914, acidentalmente, em Bruxelas, Bélgica, e aos quatro anos retornou com seus pais a Buenos Aires, Argentina. A partir de 1951 passou a viver em Paris, fugindo do peronismo. Logo, o escritor tido como portenho e parisiense não é uma coisa nem outra. Sua nacionalidade é misteriosa como sua literatura. Numa classificação superficial, tem sido arrolado entre os papas do realismo fantástico. Porém, tal rótulo não esgota a complexidade de sua literatura. Escreveu desde criança, mas só publicou seu primeiro trabalho –Presença, uma coletânea de sonetos – aos 25 anos com o pseudônimo Julio Denis, com tiragem de 250 exemplares. Um lançamento cuidadoso, de quem se preparava para vôos maiores.
Seu lançamento mais recente é o livro póstumo Papeles inesperados (Alfaragua, 2009). Faleceu em 12 de fevereiro de 1984.
Um comentário:
Você onseguiu reunir aqui os melhores nomes da literatura mundial. Está de parabéns. Biografias bem feitas e sucintas e com a cereja do bolo, as caricaturas...
Grande abraço!
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