quarta-feira, 14 de março de 2012

Affonso Romano de Sant'Anna


TENTANDO SER VEGETARIANO...
Há tempos escrevi esse poema - PEQUENOS ASSASSINATOS - que segue abaixo:

PEQUENOS ASSASSINATOS

Vegetariano
                  não dispenso chorar
sobre os legumes esquartejados
no meu prato.

Tomates sanguram em mim boca,
alfaces desmaiam ao molho de limão-mostarda-azeite,
cebolas soluçam sobre a pia
e ouço o grito das batatas fritas.

Como.
Como um selvagem, como.
Como tapando o ouvido, fechando os olhos,
distraindo na paisagem o paladar,
com a displicente volúpia
de quem mata para viver.

Na sobremesa
continua o verde desespero:
peras degoladas,
Figos desventrados
e eu chupando o cérebro
amarelo das mangas.

Isto cá for a. Pois lá dentro
sob a pele, uma intestino disputa
me alimenta: ouço o lamento
de milhões de bactérias
que o lança-chamas dos antibióticos
exaspera.

Por onde vou é luto
e luta.

Affonso Romano de Sant'Anna nasceu em 1937, em Belo Horizonte. Jornalista, professor universitário, ex-diretor da Biblioteca Nacional, é considerado unanimemente um dos mais importantes poetas brasileiros da atualidade.
Tem mais de 40 livros publicados, e é professor em diversas universidades brasileiras (UFMG. PUC-RJ, URFJ, UFF).  No exterior lecionou em universidades na Califórnia, Koln e Aix-en-Provence. Seu talento foi confirmado pelo estímulo recebido de várias fundações internacionais como a Ford Foundation, Guggenheim, Gulbenkian e o DAAD, que lhe concederam bolsas de estudo e pesquisa em diversos países. Como jornalista trabalhou nos principais jornais e revistas do país: Jornal do Brasil (pesquisa e copy desk), Senhor (colaborador), Veja (critico), Isto É (cronista), colaborador de O Estado de São Paulo. Escreve também no Estado de Minas e Correio Braziliense.
Publicou dezenas de livros de ensaios, crônicas e poesias, entre os quais: Poesia sobre poesia (Imago, 1975), Que país é este? (Rocco, 1984), Paródia, paráfrase & cia (Ática, 1985), O canibalismo amoroso(Rocco, 1990), O lado esquerdo do meu peito (Rocco, 1992), A grande fala e A catedral de Colônia (Rocco, 1998).
Recebeu algumas das principais comendas brasileiras como Ordem Rio Branco, Medalha Tirandentes, Medalha da Inconfidência, Medalha Santos Dummont. É casado com a escritora Marina Colasanti.
Fonte: Blog do Escritor

Um comentário:

Celia disse...

Tive o prazer de ouvir este poema recitado pelo próprio autor durante o Tarrafa Literária realizado na cidade de Santos. Perfeito.

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